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  • Foto do escritorEmmanuel do Valle

Fim de uma era: depois de 62 anos, o Ipswich desce à terceirona


O Ipswich da temporada 1957-58, iniciando o longo período entre a primeira e a segunda divisões.

Ao empatar em 1 a 1 com o Birmingham em Portman Road neste sábado, o Ipswich teve decretado matematicamente o seu rebaixamento para a League One, a terceira divisão do futebol do país. A campanha fraca, com apenas quatro vitórias nas 42 partidas jogadas até agora, resultou na queda inevitável. Mas, mais do que isso: trata-se do fim de um ciclo de nada menos que 62 anos vivendo entre as duas principais categorias da liga inglesa.


Os anos da terceirona


Desde 1957, quando sequer tinham estreado na elite inglesa, os Tractor Boys não sabiam o que era jogar a terceirona. Fundado em 1878, o Ipswich Town só aderiu ao profissionalismo em 1936, tornando-se (até hoje) o único clube integralmente profissional em sua região de Suffolk, no leste britânico. Dois anos depois, foi admitido na Football League. Na época, a terceira divisão era regionalizada e dividida em norte e sul, e nesta última entrou o clube.


Aquela temporada 1938-39 foi a última completa antes da deflagração da Segunda Guerra Mundial. O clube ainda disputaria outras oito temporadas – todas sob o comando do escocês Scott Duncan – antes de conquistar seu primeiro acesso à segunda divisão em 1954. O título da terceirona foi um tanto surpreendente, visto que em três das quatro temporadas anteriores o Ipswich havia terminado num modesto 17º lugar.


A campanha de estreia na segunda divisão, porém, foi bastante fraca, e o time voltou à terceira (sul) após terminar na penúltima colocação. Foi quando o clube passou por uma revolução: em agosto de 1955, Scott Duncan foi substituído por Alf Ramsey, ex-lateral do Southampton, Tottenham e seleção inglesa. Após bater na trave pelo acesso na temporada 1955-56, o Ipswich retornaria à segunda divisão ao vencer uma acirrada disputa tripla na campanha seguinte.


Alf Ramsey em sua sala em Portman Road: o homem que revolucionou o Ipswich.

Por boa parte da temporada, os Tractor Boys disputaram palmo a palmo a primeira colocação (única que dava o acesso) com o Colchester United. Da metade para o fim, o Torquay United também entrou na briga. No dia 29 de abril, o Colchester venceu o Watford por 2 a 0 e encerrou seu calendário como líder, com 58 pontos, mesmo número do Torquay (superado então pelo goal average) e um a mais que o Ipswich. Mas estes dois ainda jogariam dali a dois dias.


O time de Alf Ramsey viajaria para enfrentar o Southampton, enquanto os Gulls encarariam o Crystal Palace em Londres. Com o empate do Torquay (1 a 1), os Tractor Boys precisavam vencer para também superar o adversário no critério do goal average. E foi o que fizeram, batendo os Saints por 2 a 0 no antigo estádio de The Dell. Foi, até hoje, a última partida do Ipswich em um campeonato de terceira divisão.


Naquele último elenco do clube a disputar a terceira divisão já marcavam presença nomes como o goleiro Roy Bailey, o lateral-direito Larry Carberry (recém-promovido das categorias de base), o lateral-esquerdo escocês Ken Malcolm, o médio John Elsworthy, o meia Ted Phillips, o atacante Doug Millward e o ponteiro esquerdo Jimmy Leadbetter. Todos eles também integrantes da equipe que alcançaria para o clube a glória máxima dentro do futebol doméstico, dali a cinco anos.


O improvável título inglês


O clube passaria as três temporadas seguintes estabilizando-se na segundona, antes de arrancar para o acesso à elite conquistando o título da segunda divisão em 1960-61, sete pontos à frente do Liverpool, terceiro colocado (e não promovido). A estreia na elite começaria discreta, mas logo se tornaria memorável: o time entraria o ano de 1962 na quarta colocação, atrás de Burnley, Tottenham e Everton, e logo se infiltraria na briga pelo título.


O capitão Andy Nelson levanta o troféu da liga: um dos títulos mais surpreendentes da história.

No fim de março, a equipe sem estrelas, mas de futebol solidário dirigida por Alf Ramsey já alcançava a liderança. E na última rodada, em 28 de abril, ao derrotar o Aston Villa por 2 a 0 o estreante Ipswich conquistava um dos títulos ingleses mais surpreendentes da história. Porém, esse auge durou pouco: na temporada seguinte, com seu estilo mais manjado, o time não passou de uma fraca 17ª colocação na liga, sendo eliminado também na segunda fase da Copa dos Campeões pelo Milan.


Sem Alf Ramsey, que deixaria o clube em abril de 1963 para assumir a seleção inglesa, a campanha seguinte seria ainda pior: o Ipswich não só amargou a lanterna, como terminou a campanha com a absurda marca de 126 gols sofridos (chegou a perder por 10 a 1 para o Fulham e por 9 a 1 para o Stoke). Quatro temporadas na segundona depois, o clube estava de volta à elite, desta vez para iniciar seu período duradouro na primeira divisão.


A longa era de ouro com Bobby Robson


E novamente revelaria um técnico lendário: um certo Bobby Robson, que assumiria o comando em janeiro de 1969 e, sem muitos recursos financeiros disponíveis, passaria a prestigiar fortemente nas categorias de base. A partir de 1972-73, o clube subiria de novo de patamar: por dez anos, brigaria regularmente no Top 6 do campeonato. No único ano em que terminou abaixo disso (1978), compensou vencendo a FA Cup.


Com Bobby Robson (à esquerda, de agasalho), a segunda revolução: futebol vistoso e ótimos resultados.

O Ipswich ainda esteve muito perto de vencer novamente a liga: em 1981 e 1982, terminou na segunda colocação, perdendo suas chances apenas na última rodada e assistindo ao Aston Villa e ao Liverpool levantarem o troféu. Por outro lado, tornou-se assíduo nas copas europeias, até conquistar, também em 1981, a Copa da Uefa, eliminando no caminho o Saint-Étienne (base da seleção francesa) e o Colônia (base da seleção alemã-ocidental).


Também deu destaque a muitos jogadores que se tornaram emblemáticos do período no futebol inglês e que chegariam às suas seleções, como o capitão Mick Mills, Terry Butcher, Paul Mariner, Kevin Beattie, Russell Osman, Eric Gates e os escoceses John Wark e Alan Brazil. E seria ainda um dos primeiros clubes a trazer estrangeiros quando da abertura dos portos: a dupla de meias holandeses Arnold Mühren e Frans Thijssen marcou época na liga.


O declínio


Em julho de 1982, novamente o Ipswich perderia seu técnico para a seleção. E com a saída de Bobby Robson, o clube experimentaria um rápido declínio, encerrando seu período de 18 anos na elite com o rebaixamento para a segunda divisão sofrido em 1986. Após algumas campanhas medianas, o clube voltaria a conquistar o título da segundona em 1992, a tempo de disputar o que seria a temporada inaugural da Premier League.


Esta primeira passagem pela nova liga duraria três temporadas, até o novo descenso em 1995. Mas logo ele retornaria: após perder o acesso nos playoffs por três anos seguidos, o Ipswich voltaria para mais um último período na Premier League em 2000. De cara, um surpreendente quinto lugar levou o clube de volta às copas europeias após 18 anos de ausência. Mas a campanha seguinte, em 2001-02, seria a derradeira de sua história na elite.


Após um mau início de campanha, o time ensaiou uma recuperação e chegou a parecer salvo. Mas voltou a perder, até ser goleado pelo Liverpool por 5 a 0 na última rodada, resultado que decretou a queda. Dali em diante foram 17 temporadas na Championship (novo nome da segunda divisão). Em algumas (como em 2004, 2005 e 2015) flertou com o acesso, perdendo nos playoffs. Mas na atual, o time parecia condenado à queda desde o início, o que enfim se confirmou neste sábado.

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