top of page
  • Foto do escritorEmmanuel do Valle

As histórias do Brentford no outro período do clube na elite inglesa

Atualizado: 3 de abr. de 2022


Novidade desta temporada da Premier League que se inicia, o Brentford retorna à elite inglesa após 74 anos. Entrecortado pela suspensão dos jogos em razão da Segunda Guerra Mundial, seu período anterior na primeira divisão (o único de sua história até então) durou cinco temporadas e rendeu, no fim dos anos 1930, algumas campanhas bastante expressivas ao pequeno clube da Zona Oeste de Londres antes do rebaixamento em 1947, na edição da liga que marcou o retorno das competições após o término dos conflitos.


O CAMINHO PREGRESSO


Fundado em outubro de 1889, o clube peregrinou por várias casas até se estabelecer em 1904 no estádio de Griffin Park, onde ficou até 2020, quando da inauguração do novo Brentford Community Stadium. E antes de ser enfim admitido na Football League em maio de 1920, em meio à grande expansão provocada pela criação da terceira divisão, participou de várias outras ligas, entre elas a Southern League, associação que reunia a maior parte dos clubes profissionais de Londres na virada do século XIX para o XX.


Também foram muitas as mudanças de cores e uniformes até a instituição, em 1925, da versão atual, de camisas listradas em vermelho e branco na vertical com calções pretos e meias pretas ou vermelhas. Em maio do ano seguinte, chegaria ao clube aquele que seria seu treinador mais longevo, incluindo todo o período na elite. Vindo do Gillingham, Harry Curtis levaria logo de cara o Brentford à sua melhor campanha na FA Cup até então, alcançando a quinta fase, equivalente às oitavas de final do torneio.


O desempenho na taça fez com que o clube reunisse caixa suficiente para construir uma nova arquibancada no estádio de Griffin Park. E três temporadas mais tarde a casa dos Bees assistiria a um recorde até hoje não igualado nas quatro principais divisões: o Brentford venceu todos os seus 21 jogos como mandante na terceira divisão sul em 1929-30. Porém, a campanha fora de casa não foi boa o bastante, e o acesso não veio: o time ficou sete pontos atrás do campeão Plymouth Argyle, único a subir.


A rápida ascensão do clube até o mais alto escalão do futebol inglês só começaria após uma série de contratações importantes em 1932, incluindo a do goleador Jack Holliday e de dois jogadores que participariam de todo o ciclo do clube na elite: o meia Billy Scott e o ponta galês Idris Hopkins. O time conquistou a terceira divisão sul em 1932-33 e a segunda em 1934-35, mesma temporada em que levantou também – e pela primeira vez – a London Challenge Cup após derrotar o Millwall na decisão por 2 a 1.


DE CARA, A MELHOR COLOCAÇÃO FINAL


Embalado, o Brentford começou bem em sua temporada de estreia na primeira divisão, vencendo seus dois jogos iniciais (2 a 0 no Bolton fora de casa e 3 a 1 no Blackburn em Griffin Park) e pulando para a liderança. Porém a derrota em casa para o Huddersfield (2 a 1) na terceira rodada detonou uma sequência muito ruim que se estendeu até perto do Natal, somando apenas duas vitórias e 11 derrotas – entre elas duas goleadas: 5 a 1 em casa para o Sunderland e 6 a 1 na visita ao Grimsby – em 17 partidas.


Identificando as dificuldades de alguns de seus jogadores em manterem o nível na categoria mais alta do futebol inglês, o técnico Harry Curtis empreendeu então uma profunda reformulação no elenco. Cinco titulares – o zagueiro Jack Astley, os médios Jackie Burns e Herbert Watson, o ponta-esquerda Charlie Fletcher e o centroavante George Robson – foram barrados e logo negociados. Pela porta de entrada, chegaram o médio galês David “Dai” Richards e os atacantes escoceses David McCulloch e Bobby Reid.


O goleador David McCulloch e o médio Dai Richards.

Renovada e fortalecida, a equipe emendou três vitórias num período de quatro dias ainda no fim de 1935, batendo duas vezes o Preston (5 a 2 em casa e 4 a 2 fora) e também o Bolton (4 a 0 em Londres). Dali em diante o momento viraria completamente, e o Brentford sofreria apenas mais duas derrotas até o fim da temporada. Na reta final, chegou a permanecer 12 jogos invicto, com oito vitórias. Na última rodada, um 6 a 0 sobre o vice-campeão Derby County confirmou a ótima quinta colocação.


Aquela posição, atrás apenas de Sunderland, Derby, Huddersfield e Stoke, representaria a melhor classificação final do Brentford em sua história na primeira divisão. Além disso, ao ficar um ponto à frente do Arsenal, os Bees terminaram como o clube londrino mais bem colocado no certame. Entretanto, outros voos mais altos – embora momentâneos – ainda aguardavam pelo time nas temporadas seguintes. Com a mesma base que encerrou a temporada 1935-36 o clube iniciaria a próxima campanha.


Depois de três empates nos primeiros cinco jogos da liga, o Brentford emendou uma sequência curiosa de 15 partidas alternando vitórias e derrotas. Mesmo irregular, conseguiu escalar postos na classificação: em 10 de outubro, após golear o Manchester United por 4 a 0 em casa, pulou para a terceira colocação. Duas semanas depois com nova goleada – 5 a 2 sobre o Liverpool, com três gols de David McCulloch – alcançou a vice-liderança, posição a qual ocuparia por algumas semanas, entre idas e vindas.


Ainda em outubro, o meia-esquerda Billy Scott se tornaria o primeiro jogador do clube a atuar pela seleção inglesa numa partida oficial. E entre 19 de dezembro de 1936 e 6 de fevereiro de 1937, o Brentford chegaria a permanecer oito jogos invicto. Porém, logo depois perderia o fôlego, saindo derrotado em metade de suas 16 partidas restantes (incluindo uma goleada de 6 a 2 para o futuro campeão Manchester City) e terminando a campanha na sexta posição, uma abaixo da temporada anterior.


OS INESQUECÍVEIS DIAS NO TOPO


Para dar um pouco mais de profundidade ao elenco e entrar de vez na briga pelo título, o técnico Harry Curtis trouxe reforços importantes, além de promover alguns juvenis. O goleiro Joe Crozier, o médio Tally Sneddon (ambos escoceses) e o meia-direita George Eastham (pai do jogador de mesmo nome que integraria o grupo da seleção inglesa campeã mundial em 1966) se tornariam titulares naquela campanha em que os Bees alcançaram, por um certo período, seu posto mais alto na liga na história.


A trajetória começou com uma derrota por 2 a 0 para o Bolton fora de casa, mas rapidamente o time engrenou e começou a vencer. E em 16 de outubro, ao golear o Charlton por 5 a 2, assumiu pela primeira vez a liderança da liga. O jogo chamou a atenção por vários motivos: o adversário tinha, disparado, a defesa menos vazada do certame até aquele jogo. David McCulloch marcou quatro vezes, chegando a sete jogos seguidos balançando as redes. E impressionava, sobretudo, a fluência do jogo do Brentford.


Tally Sneddon.

Em especial o dos médios Duncan McKenzie e Tally Sneddon, cuja troca constante e rápida de posições mereceu elogios na crônica do jornal The Times: “Seria difícil superestimar a qualidade do futebol jogado pelo Brentford. Eles foram tão inteligentes, tão adaptáveis ​​em suas idéias. McKenzie e Sneddon pareciam capazes de trucidar a defesa de Charlton”. O time de Harry Curtis parecia então uma máquina bem azeitada, e logo se firmaria na liderança, abrindo vantagem em relação aos perseguidores.


Em 26 de janeiro de 1938, o Brentford derrotou o Everton por 3 a 0 e abriu quatro pontos de frente sobre o Wolverhampton, segundo colocado – ainda que com três jogos a mais. Em seus últimos 20 jogos pelo campeonato, desde o triunfo sobre os próprios Wolves por 2 a 1 na metade de setembro, havia contabilizado 12 vitórias, cinco empates e apenas três derrotas. E a partida seguinte, dali a apenas três dias, seria exatamente a da volta contra o vice-líder, na casa do adversário, no estádio de Molineux.


Os Wolves teriam sua revanche, devolvendo os 2 a 1 da ida. A princípio, o resultado não tirou o Brentford do topo da tabela. Mas deu início a uma sequência muito ruim, na qual o time somou apenas dois pontos (dois empates) em oito jogos e despencou para a sétima posição na metade de março. Embora ainda voltassem a vencer (inclusive batendo duas vezes o futuro campeão Arsenal e goleando o Grimsby por 6 a 1), os Bees logo perderiam de vez a chance de título, de novo se contentando com o sexto lugar.


De qualquer modo, aquela seria uma temporada marcante também pela boa campanha na FA Cup, a melhor da história do clube até ali. Jogando sempre no Griffin Park, o Brentford derrotou o Fulham (3 a 1), o Portsmouth (2 a 1) e o Manchester United (2 a 0), antes de receber o Preston North End nas quartas de final. Porém, mesmo jogando diante de seu recorde de público naquela temporada (37.586 torcedores), a equipe acabou superada pelos futuros campeões, caindo por um inapelável 3 a 0.


O DECLÍNIO ATÉ O DESCENSO


Depois de três temporadas brigando – de modo até surpreendente – na parte de cima da tabela, o Brentford iniciaria seu declínio como clube de primeira divisão em 1938-39. Uma das causas foi o sensível enfraquecimento do elenco: enquanto alguns titulares importantes deixaram o clube, o técnico Harry Curtis não conseguiu trazer os reforços que pretendia, como o médio Joe Mercer, do Everton, ou o meia Peter Doherty, do Manchester City. Diante disso, foi preciso apostar em nomes das categorias inferiores.


Um deles – o ponta-esquerda Les Smith, de apenas 21 anos – até se destacaria ao ponto de se tornar, ao fim daquela temporada, o segundo jogador do clube a defender a Inglaterra, num amistoso contra a Romênia em Bucareste em maio de 1939. Mas mesmo o futebol do promissor atacante não bastaria para manter o Brentford no nível das campanhas anteriores na liga. De modo que, se na virada de 1937 para 1938 o clube ocupava a liderança, exatamente um ano depois era o penúltimo, na zona de descenso.


O que acabaria resgatando a equipe das últimas posições seria uma sequência de cinco vitórias entre fevereiro e março de 1939, fazendo o Brentford saltar da 21ª para a 13ª colocação. Mais adiante, no início de abril, outros dois triunfos consecutivos em casa (2 a 0 no Leicester e 3 a 1 no Preston) forneceram a reserva de gordura necessária para atravessar a reta final da campanha sem sustos. Nos últimos seis jogos, o time somou só um ponto, mas terminou em 18º, cinco pontos à frente do rebaixado Birmingham.


Um empate diante do atual campeão Everton em 1 a 1 dentro do Goodison Park foi um início animador para o Brentford na temporada 1939-40. Porém, após uma derrota diante do Blackpool fora de casa (2 a 1) e uma vitória por 1 a 0 sobre Huddersfield no Griffin Park, a campanha seria interrompida: com a declaração de guerra à Alemanha nazista pelo primeiro-ministro britânico Neville Chamberlain, todas as atividades esportivas na Inglaterra seriam paralisadas, provocando o cancelamento da temporada da liga.


Substituída pelas competições regionalizadas extraoficiais durante a Segunda Guerra Mundial, a estrutura da Football League só seria retomada na temporada 1946-47. Com um time formado por vários ex-jogadores do clube trazidos de volta, o Brentford chegou a levar a campo a equipe de maior média de idade em sua história. Entretanto, em vez de experiência, o que se viu foi uma equipe que se arrastou durante a competição ao longo de toda a temporada, exceto em dois momentos de bom rendimento.


Um deles veio nas cinco primeiras rodadas, quando os Bees obtiveram quatro vitórias e chegaram a ocupar a liderança, e o outro entre a rodada de Boxing Day e o meio de janeiro, também de cinco jogos, com três vitórias e um empate. Mas o resto da temporada foi desastroso. Entre 21 de setembro e 25 de dezembro, o time só venceu um jogo em 15, sendo derrotado em nada menos que 11. E de 1º de fevereiro de 1947 até o fim da campanha, de novo só colheu mais uma vitória, com 13 revezes em 17 partidas.


Arsenal x Brentford em Highbury, abril de 1947.

Em 17 de maio, um empate em 1 a 1 com o Liverpool no Griffin Park no antepenúltimo jogo da campanha decretou matematicamente a queda do Brentford. Curiosamente, o adversário dos Bees em sua partida de despedida da elite naquela temporada havia sido o Arsenal, mesmo rival da estreia na atual campanha de retorno – e contra quem o time da Zona Oeste de Londres pode se orgulhar de ter um retrospecto favorável levando em conta os confrontos pela primeira divisão em sua passagem anterior pela elite.


O Brentford, aliás, mediu forças contra dez dos outros 19 clubes desta edição da Premier League naquele seu outro período na primeira divisão. Nunca perdeu para o Leicester nem venceu o Aston Villa. Além dos Gunners e dos Foxes, também leva a melhor nos números contra o Everton. Contra os Wolves, são cinco vitórias para cada lado em dez jogos. E não faz feio contra Chelsea, Leeds, Liverpool e a dupla de Manchester, United e City, levando desvantagem de apenas uma vitória num retrospecto bastante parelho.


OUTRAS CURIOSIDADES SOBRE OS BEES


Após o rebaixamento de 1947, o Brentford amargaria novo descenso em 1954, desta vez para a antiga terceira divisão sul. Num período de 60 anos, só disputaria uma vez – em 1992-93 – uma categoria acima da terceirona. Somente em 2014 é que conseguiria subir e se estabelecer na Championship, até o recente acesso à Premier League. Mas mesmo nas divisões inferiores o clube pôde contar com alguns nomes importantes da história do futebol inglês, como Ron Greenwood e Jimmy Hill.


Torcedor dos Bees quando garoto, o primeiro foi um defensor que iniciou a carreira no Bradford Park Avenue, chegando ao Griffin Park em 1949. Disputou 142 partidas, ocupando o posto de capitão entre 1950 e 1952, ano em que defendeu a seleção B da Inglaterra num amistoso contra a Holanda. Mais tarde, após passar por Chelsea e Fulham, ele se tornaria treinador renomado, contando 13 anos à frente do West Ham e dirigindo o English Team por cinco anos, incluindo a Copa do Mundo de 1982.


Já o segundo foi o que se costuma chamar de “homem da renascença” do futebol: foi jogador, técnico, líder sindical, dirigente, presidente de clube, apresentador de televisão, comentarista e árbitro auxiliar. No Brentford, seu primeiro clube como atleta profissional, ele atuou como meia direita exatamente na mesma época de Ron Greenwood, entre 1949 e 1952, antes de ser vendido ao Fulham. Em 1961, se celebrizaria por liderar a campanha vitoriosa contra a liga pelo fim do teto salarial dos atletas profissionais.


Outro nome revelado pelo Brentford que ganharia certa projeção seria o ponta-esquerda Andy Sinton, que atuou pelo clube entre 1985 e 1989, ano em que se transferiu para o vizinho Queens Park Rangers – pelo qual chegaria à seleção inglesa na era Graham Taylor, disputando a Eurocopa de 1992. Por fim, nos anos 1980/90 o clube se tornou uma espécie de celeiro do Wimbledon ao ceder, entre outros, o atacante Marcus Gayle, que defenderia a Jamaica na Copa do Mundo de 1998, já como jogador dos Dons.

292 visualizações0 comentário
bottom of page