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  • Foto do escritorEmmanuel do Valle

Expulso da Football League, Bury já teve sua era de ouro na elite inglesa e na FA Cup


O time do Bury que conquistou o segundo título da FA Cup, em 1903, goleando o Derby por 6 a 0.

Expulso da Football League nesta terça-feira por dívidas e irregularidades administrativas, o Bury tinha história mais do que centenária na entidade. O clube da região da Grande Manchester teve seu melhor momento entre 1895 e 1929, quando esteve na primeira divisão em 22 das 30 temporadas disputadas no período. Também naquela virada de século, chegou a vencer a FA Cup duas vezes, inclusive estabelecendo recordes. Relembramos aqui sua trajetória na categoria principal do futebol inglês.


O COMEÇO DA HISTÓRIA


Fundado em 1885, o Bury começou sua história competitiva na Liga de Lancashire, da qual foi um dos fundadores em 1889. Vice-campeão na temporada inaugural, conquistou o título nos dois anos seguintes – o segundo deles, em dobradinha com a Copa da Lancashire, na qual derrotou o Everton na decisão. Na mesma temporada 1891-92, também aconteceu sua primeira participação na FA Cup.



Sua aceitação na Football League veio em 1894, entrando no campeonato da segunda divisão em 1894-95. Comprovando sua já conhecida força numa região de muitos clubes importantes do futebol inglês, os Shakers foram campeões com folga, vencendo seus 15 jogos em casa e ficando nove pontos à frente do segundo colocado Notts County a dez de vantagem do terceiro, Newton Heath, mais tarde rebatizado Manchester United.


Naquele tempo, no entanto, o acesso e descenso não eram diretos. Os três primeiros colocados da segunda divisão enfrentavam os três últimos da primeira nas chamadas “test matches”, uma espécie de playoff. Coube ao Bury enfrentar o Liverpool, lanterna da elite, no campo neutro de Ewood Park, em Blackburn. A vitória por 1 a 0 no dia 27 de abril de 1895 confirmou o acesso dos Shakers e a queda dos Reds.



Começaria ali o maior período do clube de Lancashire na primeira divisão: foram 17 campanhas consecutivas na elite, com alguns grandes resultados. Na primeira participação (na qual o clube terminou num modesto 11º posto entre 16 clubes), destaque para a vitória de 5 a 3 em seu estádio de Gigg Lane sobre o futuro campeão Aston Villa. Dois anos depois, porém, o clube ficou bem perto dos “test matches”, salvo pelo goal average.


Em 1899, o clube outra vez ficou no meio da tabela, mas registrou ótimos resultados em Gigg Lane, não só voltando a vencer o Aston Villa (que caminhava para mais um título) por 2 a 1, como também aplicando um convincente 3 a 0 sobre o futuro vice-campeão Liverpool. Já na campanha seguinte, o clube voltou a demonstrar sua força em casa, derrotando nada menos que os cinco primeiros colocados na classificação final.


O PRIMEIRO CANECO


O Bury (de camisa branca) encara o Southampton na decisão da FA Cup de 1900.

Mas o grande feito daquela temporada foi, sem dúvida, seu primeiro título da FA Cup. Em especial pelo fato de ter sido sorteado como visitante em todas as etapas do torneio. Na estreia, bateram o Burnley (1 a 0). Nas duas fases seguintes, segurou empates fora de casa com o Notts County (0 a 0) e o Sheffield United (2 a 2), derrotando ambos por 2 a 0 nos replays em Gigg Lane. Já nas semifinais, em campo neutro, o rival foi o Nottingham Forest.



O empate em 1 a 1 no primeiro jogo, disputado no Victoria Ground de Stoke, levou a um replay em Bramall Lane, o campo do Sheffield United, vencido pelos Shakers por 3 a 2, numa virada sensacional após sofrer os gols nos dois minutos iniciais. Assim, o time avançou à decisão diante do Southampton, então um clube da Liga Sulista (campeonato organizado por outra entidade que corria em paralelo com a Football League).


O jogo foi disputado em 21 de abril de 1900 no antigo estádio de Crystal Palace, então o principal de Londres (e que precede a fundação do clube de mesmo nome, em 1905). Diante de mais de 68 mil torcedores, o Bury não tomou conhecimento do Southampton, marcando três vezes no primeiro tempo com dois gols de Jasper McLuckie e um de Willie Wood, e fechando a contagem em 4 a 0 na etapa final por meio de John Plant.


Jogadores do Bury comemoram o segundo gol nos 4 a 0 diante do Southampton.

Embalado pela conquista da copa, o Bury partiu para sua primeira grande campanha na primeira divisão na temporada seguinte, terminando em quinto, apenas seis pontos atrás do campeão Liverpool. E em 1903, levantaria pela segunda vez o troféu mais tradicional do futebol inglês, agora com campanha ainda mais arrasadora, vencendo todas as partidas sem sofrer um gol sequer e goleando o Derby County na decisão.


BI DA FA CUP VEM COM RECORDES


Nas três primeiras fases, os Shakers superaram o Wolverhampton em casa, o Sheffield United fora e o Notts County de novo em seu estádio, todos por 1 a 0. Na semifinal, jogando no Goodison Park, derrotou o Aston Villa por 3 a 0. E na final, outra vez disputada no estádio de Crystal Palace, aplicou um histórico 6 a 0 no Derby, o maior placar da história das decisões da taça, igualado somente este ano pelo Manchester City diante do Watford.



O resultado foi surpreendente não só pelo placar, mas porque o Derby era considerado um time mais forte, mesmo com a ausência de seu goleador Steve Bloomer. Outra curiosidade é a de que ambos os times tiveram de trocar de camisa antes do jogo, já que ambos usavam branco: o Bury (que alinhava seis jogadores do time que vencera o torneio em 1900) vestiu azul-claro, enquanto o Derby entrou em campo de vermelho.


O Bury marcou apenas uma vez no primeiro tempo, com seu capitão George Ross, e deslanchou na etapa final, com o segundo gol marcado por Charlie Sagar logo aos três minutos e outros três anotados quase em sequência por Joe Leeming, Willie Wood e John Plant, entre os 11 e os 14 minutos. Mais tarde, o goleiro do Derby, Jack Fryer, deixou o campo lesionado, mas o Bury só anotou mais uma vez, de novo com Leeming.


A goleada de 6 a 0 sobre o Derby (de uniforme escuro) na final da FA Cup em 1903.

Porém, o clube não manteve o pique nas temporadas seguintes. Em 1904-05, embora tivesse aplicado a maior goleada da primeira divisão (7 a 1 no Sheffield United), acabou na penúltima colocação da liga e só foi salvo do rebaixamento graças à expansão do campeonato de 18 para 20 clubes a partir da próxima edição. Já em 1906, acabou novamente escapando do descenso por apenas um ponto.


EM 1912, O PRIMEIRO DESCENSO


O bom sétimo lugar na temporada 1907-08 acabou se mostrando apenas um alarme falso de reação: na campanha seguinte, o time voltaria a brigar contra a queda, agora escapando por dois pontos – o que se repetiria dois anos depois. De tanto flertar com o rebaixamento, ele acabou vindo em 1912, encerrando seus 17 anos seguidos na elite, muito em consequência de uma fraca campanha como visitante.



Nas 19 partidas fora de casa, o time somou apenas quatro pontos, sem nenhuma vitória, e anotou apenas nove gols. Também venceu pouco em casa, em comparação com os outros times da liga (apenas seis triunfos) e terminou com 21 pontos ganhos no total, 12 a menos que o também rebaixado Preston North End e 13 atrás dos salvos Liverpool e Oldham.


Pelos três anos seguintes, antes da paralisação dos jogos com a deflagração da Primeira Guerra Mundial, o clube passou a viver num limbo, com campanhas discretas na segunda divisão, além de uma crise financeira que se estendeu pelos primeiros anos após o fim do conflito. O processo começou a ser revertido em 1922, quando inesperadamente o clube ganhou a posse do terreno de seu estádio de Gigg Lane.


A SEGUNDA PASSAGEM PELA ELITE


Na temporada 1923-24, enfim o clube conseguiria um novo acesso à elite como vice-campeão da segunda divisão, atrás do Leeds United e superando o Derby County pelo critério do goal average. Começaria ali sua segunda e última passagem pela elite, também com alguns bons resultados. Logo na primeira campanha, os Shakers obteriam um ótimo quinto lugar, igualando sua melhor colocação na história até então.


O time de 1925-26: melhor campanha na primeira divisão.

Já em 1925-26, eles superariam essa marca, terminando na quarta colocação, atrás apenas do campeão Huddersfield, do Arsenal e do Sunderland. Naquela campanha, aplicariam sua maior goleada na elite, fazendo 8 a 1 no Burnley. O estádio de Gigg Lane também assistiu a dois jogos com muitos gols: as vitórias do Bury por 6 a 5 sobre o Manchester City e por 7 a 4 diante do quinto colocado Sheffield United.



O clube desceu para um modesto 19º lugar, numa liga já expandida para 22 clubes, na temporada seguinte, mas de novo esteve envolvido num jogo de muitos gols, a vitória de 7 a 3 sobre o West Bromwich Albion. O último bom momento do Bury na elite veio em 1927-28, quando mais uma vez terminou na quinta colocação, superado apenas pelo campeão Everton e pelo Huddersfield, o Leicester e o Derby County.


Aquela foi uma campanha bem no estilo “matar ou morrer”: 20 vitórias, 18 derrotas e apenas quatro empates. Os jogos com o Liverpool foram exemplos dessa “bipolaridade”: vitória por 5 a 2 no Gigg Lane e derrota por 5 a 1 em Anfield. A liga como um todo foi muito equilibrada: os 44 pontos que deram ao Bury o quinto lugar superavam em apenas sete a pontuação do lanterna Middlesbrough – que, aliás, goleou os Shakers por 6 a 1 em casa.



A despedida da elite viria na temporada 1928-29, com o time em penúltimo lugar, rebaixado junto com o Cardiff City. Seu maior resultado numa campanha de 23 derrotas em 42 jogos foi a vitória de 3 a 1 sobre o Leicester, no Natal de 1928 em Gigg Lane, que no fim das contas ajudaria a encaminhar o título para o The Wednesday (atual Sheffield Wednesday), campeão por um ponto de vantagem sobre os Foxes.


OS OUTROS 90 ANOS


O meia Colin Bell no Bury em 1966: destinado a brilhar no Manchester City e na seleção.

O clube ainda chegaria perto de retornar à primeira divisão em algumas ocasiões nos anos 30: foi quinto colocado na segundona em 1930 e 1932, quarto em 1933 e terceiro em 1937. Mas após a Segunda Guerra Mundial, começaria a definhar, embora chegasse a revelar pelo menos um grande nome do futebol inglês: o meia Colin Bell, que faria história no Manchester City nos anos 60 e 70 e jogou a Copa do Mundo de 1970 pela seleção.


Após uma longa sequência de campanhas de medianas para fracas, o time cairia para a terceira divisão pela primeira vez em 1957. E em 1971, desceria pela primeira vez à quarta. Nos últimos 50 anos, praticamente limitou-se a oscilar entre as duas divisões mais baixas da Football League, exceto por duas temporadas – 1997-98 e 1998-99 – na Division 1, categoria equivalente à segunda divisão (e à atual Championship).


Sua saída forçada da liga encerra uma presença constante de 125 anos nas quatro principais categorias do futebol inglês. E também traz de volta um fato que não se via há 27 anos: as últimas vezes em que clubes deixaram a Football League por motivos financeiros datavam de 1992: em março daquele ano, o Aldershot havia sido expulso da entidade após ter falência decretada, enquanto em setembro foi a vez do Maidstone se retirar.

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