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Os 50 anos do segundo título inglês do Derby em temporada imprevisível

  • Foto do escritor: Emmanuel do Valle
    Emmanuel do Valle
  • 23 de abr.
  • 26 min de leitura

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Observar com o olhar de hoje as primeiras posições da classificação final da primeira divisão inglesa na temporada 1974-75 causa uma surpresa atrás da outra. Middlesbrough, Sheffield United, Stoke, Everton, Ipswich, Derby County – que selou matematicamente a conquista há exatos 50 anos –... estão todos lá entre os sete primeiros colocados, sendo o vice-campeão Liverpool o único que hoje ainda briga regularmente pelo caneco na era Premier League.


Correndo os olhos pela tabela, ainda é possível notar a ausência do Manchester United – então na segunda divisão – e os gigantes londrinos à beira da zona de rebaixamento, além do Manchester City num discreto oitavo lugar. Mas que temporada maluca foi essa que consagraria pela segunda vez em quatro anos (e pela última vez na história) o Derby County, agora comandado pelo ex-jogador Dave Mackay, substituto do eterno Brian Clough?


É o que contamos – e contextualizamos – no texto a seguir.


O FIM DE UMA ERA


Conforme a década de 1970 foi chegando à sua metade, o futebol inglês assistiu, com crescente perplexidade, ao fim da linha para uma dezena de técnicos lendários à frente de seus respectivos times. A tendência havia começado logo depois da virada da década, quando Matt Busby deixou de vez o comando do Manchester United após um breve retorno como interino entre dezembro de 1970 e junho de 1971, que se somava aos quase 24 anos como efetivo no cargo nos Red Devils, os quais ascendera a um patamar nunca visto.


Além de revelar inúmeros jogadores históricos do clube, os chamados “Busby Babes”, o técnico escocês transformou o United num dos clubes mais vencedores do país durante as décadas de 1950 e 1960: foram cinco títulos da liga e dois da FA Cup, além da Copa dos Campeões de 1968, vencida pela primeira vez por um clube inglês. E, além de tudo, sobreviveu ao desastre aéreo de Munique, em fevereiro de 1958, que quase dizimou o elenco. Sem ele, os Red Devils minguaram até serem rebaixados na temporada 1973-74.


O próximo da lista seria o rival do United, o Manchester City, que desfez sua dupla mágica formada por Joe Mercer e Malcolm Allison em outubro de 1971, quando, em manobra tramada por Allison, Mercer foi conduzido a um cargo de supervisor, enquanto ele, de auxiliar, passava a técnico principal. Dois anos depois, nem um nem o outro estavam mais no clube: Mercer saíra para dirigir o Coventry em junho de 1972 e Allison iria para o Crystal Palace em março de 1973. No legado da dupla, um punhado de conquistas históricas.


Um cargo administrativo, não-executivo, também seria o destino do discreto Harry Catterick no Everton a partir de abril de 1973, depois que o técnico das brilhantes equipes campeãs inglesas em 1963 e 1970 e da FA Cup em 1966 sofreu um infarto em janeiro de 1972, voltando de Sheffield, onde havia ido assistir a uma semifinal da Copa da Liga entre West Ham e Stoke. Com a saúde inspirando cuidados, o comandante dos Toffees – no cargo desde 1961 – passou o bastão a seu auxiliar Tommy Eggleston, que assumiu como interino.


Brian Clough (terno escuro) e Peter Taylor em 1973: perdendo a queda de braço com a direção do Derby.
Brian Clough (terno escuro) e Peter Taylor em 1973: perdendo a queda de braço com a direção do Derby.

De temperamento oposto ao de Catterick, o falastrão e impulsivo Brian Clough também deixaria o Derby County, o qual havia levado à primeira divisão em 1969 e ao título inglês inédito em 1972. Após sucessivas desavenças com o presidente do clube, Sam Longson, Clough e seu auxiliar Peter Taylor arriscaram uma cartada alta ao pedirem demissão de seus cargos em outubro de 1973, certos de que venceriam a queda de braço. Mas mesmo tendo torcida e jogadores ao seu lado, a dupla não conseguiu sensibilizar Longson a readmiti-los.


A partir de meados de 1974, as saídas chocantes se tornaram quase mensais. E a primeira delas seria logo a do técnico da seleção inglesa, Alf Ramsey. Imortalizado no país por levar o English Team ao título mundial em casa em 1966, Ramsey viu sua reputação se desgastar com a queda nas quartas de final da Copa seguinte, no México, e ruir de vez quando os ingleses sequer se classificaram para a Eurocopa de 1972 e o Mundial de 1974. Após este último revés, sua saída ainda se arrastou por alguns meses, até ser anunciada em maio.


Sem Ramsey, mas com alguns amistosos agendados para o meio do ano, a seleção inglesa recrutou Joe Mercer – ele mesmo, o ex-Manchester City – como interino, até anunciar em 1º de julho o novo ocupante oficial do cargo: Don Revie, que acabara de levar o Leeds ao título inglês com campanha notável. Revie, aliás, tirara o clube da segunda divisão em 1964, e o levara a erguer os primeiros canecos de sua história. E não foram poucos: duas ligas, uma FA Cup, uma Copa da Liga e duas Copas das Feiras (torneio antecessor da Copa da Uefa).

 

Curiosamente, o nome escolhido pelos dirigentes do Leeds para suceder Don Revie também causaria enorme estranheza no meio futebolístico inglês: era ninguém menos que Brian Clough, seu notório antípoda, crítico mais do que declarado dos métodos do agora técnico da seleção. Vindo de passagem curta e sem sucesso pelo Brighton, da terceira divisão, Clough chegava a Elland Road sem seu fiel escudeiro Peter Taylor e tendo de dobrar a antipatia do elenco dos Whites. Previsivelmente, não daria certo, como veremos.


Ainda naquele mês, outro “reinado” chegou ao fim sob grande comoção na região de Merseyside. O escocês Bill Shankly deixava o Liverpool, o qual comandava desde dezembro de 1959. Foi mais um treinador a se notabilizar por tirar o clube da segundona (em 1962) e passar a empilhar conquistas, algumas inéditas. Venceu três vezes a liga e duas vezes a FA Cup (as duas primeiras da história do clube), além da Copa da Uefa de 1973 (também o primeiro caneco continental dos Reds). Mas, já passando dos 60 anos, decidiu se aposentar.


A despedida oficial de Shankly aconteceria na mesma partida em que Clough faria sua estreia oficial dirigindo o Leeds, na Charity Shield (atual Community Shield), a supercopa inglesa que colocava frente a frente os detentores da liga (Leeds) e da FA Cup (Liverpool). O jogo em Wembley terminou 1 a 1, com o time de Shankly vencendo nos pênaltis. Mas o que fez a partida entrar para a história foi a sucessão de atritos entre os jogadores em campo, culminando nas expulsões de Kevin Keegan, dos Reds, e Billy Bremner, dos Whites.



Este tipo de comportamento, cada vez mais frequente no campo e na arquibancada, era o que enojava Bill Nicholson, lendário técnico do Tottenham desde 1958. Campeão inglês como jogador pelo clube em 1951, ele arrebataria muitos outros canecos no comando do time: a dobradinha histórica liga + FA Cup em 1961 (a primeira conseguida por um clube inglês no século), mais dois títulos da FA Cup (1962 e 1967), duas Copas da Liga (1971 e 1973), além de uma Recopa europeia (1963) e a edição inaugural da Copa da Uefa em 1972.


Apesar de todas essas conquistas, Nicholson se via cada vez mais desmotivado e desiludido num ambiente futebolístico bem diferente do que conhecera: “Os jogadores se tornaram intratáveis. Não há mais respeito”, desabafou, em meio às crescentes exigências – inclusive financeiras – feitas pelos atletas. Outra angústia para o técnico era contemplar o crescimento do hooliganismo, como acontecera nas finais da Copa da Uefa de 1974, em que a derrota do Tottenham para o Feyenoord foi seguida por distúrbios entre torcedores.

 

Nicholson ainda começaria a temporada 1974-75 no comando dos Spurs, mas, desgastado pelo mau começo de campanha do time, pelos recentes atritos com o atacante Martin Chivers quanto à sua renovação de contrato e pela dificuldade de contratar novos jogadores (que cobravam algum pagamento “por fora”), o técnico jogaria a toalha em setembro de 1974. Para piorar, o clube não só ignorou suas indicações para a escolha de seu substituto, como apontou um ex-capitão do Arsenal, Terry Neill. Tempos turbulentos o aguardavam.


Além do Tottenham, com quem Nicholson encerrava um vínculo de 38 anos como jogador e técnico, dois outros clubes londrinos promoviam sua troca de guarda. No West Ham, Ron Greenwood passava a gerente geral após 13 anos como treinador. Já no Chelsea, Dave Sexton seria demitido em outubro, com a temporada iniciada, seguindo pouco depois para o Queens Park Rangers, também ali da Zona Oeste de Londres. Tanto Greenwood quanto Sexton haviam conduzido seus clubes a títulos inéditos da FA Cup e da Recopa europeia.


No Arsenal é que Bertie Mee continuava, por enquanto, no cargo. Médico do clube conduzido ao posto de técnico, ele encerrou o jejum do clube de 17 anos sem grandes conquistas vencendo a Copa das Feiras em 1970 e completando a dobradinha liga + FA Cup em 1971, emulando o feito histórico do rival Tottenham. Mas a saída de seu braço-direito estrategista Don Howe em julho de 1971 fez os Gunners definharem, o que se acentuou a partir da temporada 1973-74. Bertie Mee se aposentaria em maio de 1976.


A SENSAÇÃO INICIAL


Com tudo isso posto, eram tantas transformações num curto espaço de tempo, tantas incógnitas lançadas, que o campeonato partia sem um favorito claro. Era difícil esperar consistência de alguém sob esse contexto. Se nada mais era como antes entre os costumeiros protagonistas, podia dar qualquer coisa. E quem se aproveitou disso inicialmente foi um clube recém-promovido, estreante na primeira divisão: o Carlisle United, da região da Cúmbria, no extremo norte da Inglaterra, colada à fronteira com a Escócia.


Terceiro colocado na segunda divisão em 1973-74, o Carlisle acabou se tornando também o primeiro beneficiado pelo aumento no número de promovidos à elite (de dois para três), instituído naquela temporada. E o início da campanha foi o que todos os torcedores do clube gostariam de guardar numa cápsula do tempo para reviver sempre: no sábado de estreia, 17 de agosto, o time bateu o Chelsea dentro de Stamford Bridge por 2 a 0, gols do zagueiro Bill Green e do atacante Les O’Neill, surpreendendo o goleiro Peter Bonetti.


O estreante Carlisle: líder nas primeiras rodadas.
O estreante Carlisle: líder nas primeiras rodadas.

Três dias depois, o time voltaria a vencer por 2 a 0 como visitante, agora diante do Middlesbrough em Ayresome Park, com dois gols de Les O’Neill. E no sábado seguinte, na primeira partida em seu estádio de Brunton Park, um gol de pênalti do meia Chris Balderstone – que, curiosamente, dividia seu tempo entre o futebol e o críquete – definiu o triunfo por 1 a 0 sobre o Tottenham que alçou o time à liderança, superando o Ipswich pelo critério então vigente do goal average (divisão dos tentos marcados pelos sofridos).


Três vitórias em três jogos e o topo da tabela: o céu parecia ser o limite para a equipe do técnico Alan Ashman, campeão da FA Cup dirigindo o West Bromwich Albion em 1968 e vindo de rápida passagem pelo Olympiacos grego. Mas nem mesmo naquele contexto de imprevisibilidade o bom momento duraria e logo o Carlisle já havia descido à parte de baixo da tabela. Contudo, antes de acabar rebaixado como lanterna – e de nunca mais retornar à elite – ainda faria alguns estragos, tornando-se particularmente o terror dos ponteiros.


Em dezembro, o time foi ao Goodison Park enfrentar o líder Everton. Perdia por 2 a 0 no início da etapa final, mas arrancou uma virada improvável, tirando os Toffees do topo da tabela, ultrapassados pelo Ipswich de Bobby Robson. E contra quem seria a vitória seguinte do Carlisle, em 18 de janeiro? Exatamente o Ipswich, por 2 a 1 – e ironicamente devolvendo a liderança ao Everton. Os Toffees, porém, voltariam a sofrer com a equipe da Cúmbria em março, ao perderem por 3 a 0 em Brunton Park e deixarem mais uma vez a liderança.


Antes disso, ainda em outubro, o Carlisle já havia aterrorizado o futuro campeão (mas ainda não líder) Derby County também por 3 a 0 em Brunton Park. Em março, superaria o Manchester City (que já havia ocupado a liderança) por 2 a 1 dentro de Maine Road e o Burnley (que andou rondando as primeiras posições) por 4 a 2. E na despedida da elite, em 30 de abril, seguraria um 0 a 0 em pleno Baseball Ground com o agora já campeão Derby – contra quem terminaria sem perder e sem sofrer um gol sequer nos dois confrontos.


LONDRINOS A PERIGO


Se o pequeno clube do norte foi a sensação ao menos inicial, a decepção da temporada ficou com os clubes de Londres – exceção feita ao West Ham, que fez campanha mediana na liga, mas levantou o título da FA Cup diante de outro londrino, o Fulham, da segunda divisão. No fim de setembro, Chelsea, Arsenal, Tottenham e Queens Park Rangers ocupavam quatro das cinco últimas posições, tendo a companhia do Leeds – detentor do título, mas ocupando apenas o 19º lugar na ocasião. Foi uma temporada dura para a capital.


O Queens Park Rangers ainda conseguiria se reabilitar do início ruim quando Dave Sexton chegou para o lugar de Gordon Jago. Aos poucos a equipe foi somando pontos e escalando a classificação. Chegaria a alcançar a sétima posição em meados de março após bater o Chelsea, ex-clube de Sexton, por 1 a 0 em Loftus Road, mas terminaria numa ainda sim aceitável 11ª posição. Foi um bom impulso para o treinador consolidar o time que, na temporada seguinte, brigaria pelo título na melhor campanha da história do clube na liga.


Em seus primeiros 13 jogos, o Arsenal venceu apenas dois e perdeu oito, chegando a ocupar a lanterna. Mas logo passaria a somar pontos (vencendo inclusive os dois confrontos com o Liverpool em Highbury e Anfield), mantendo-se fora da zona de rebaixamento (ao contrário de Chelsea e Tottenham), ainda que sob ameaça constante da degola. Os rivais, aliás, cruzariam-se no fim de abril, nas últimas rodadas do campeonato em jogos quentes e decisivos. E o primeiro deles se tornaria um marco na rivalidade entre Spurs e Blues.



No dia 19, diante de mais de 50 mil torcedores (seu público recorde na temporada), o Tottenham, antepenúltimo colocado, recebeu o Chelsea, uma posição e um ponto acima, em White Hart Lane. Antes da partida, grupos de torcedores dos dois times invadiram o gramado e brigaram por cerca de 20 minutos. Quando a bola rolou, os Spurs venceram por 2 a 0, gols de Steve Perryman e Alfie Conn no segundo tempo, enquanto os Blues tiveram um gol anulado por toque de mão e perderam chance claríssima, com o gol aberto.


A vitória fez o Tottenham sair da zona de rebaixamento e empurrar o Chelsea para dentro, na penúltima colocação. Mas a ameaça do descenso voltaria a rondar os Spurs uma semana depois: derrotados pelo Arsenal em Highbury por 1 a 0, gol de Brian Kidd, no derby do Norte de Londres, eles próprios passaram a ocupar a penúltima colocação. Mas ainda haveria um jogo adiado contra o Leeds em casa, em 28 de abril, dois dias após a última rodada regular. O Tottenham venceu por 4 a 2 e escapou da degola, caindo o Chelsea.

 

A LIDERANÇA DE MÃO EM MÃO


Se a briga contra o rebaixamento foi acirradíssima, a disputa na parte de cima da tabela foi nada menos que insana. Entre a chegada do surpreendente Carlisle ao topo, na terceira rodada, e o momento em que o Derby County assenhorou-se da liderança para não mais abrir mão, já nas últimas semanas, a primeira colocação trocou de ocupante nada menos do que 21 vezes, e entre sete clubes: além dos dois já citados, Ipswich, Liverpool, Manchester City, Stoke e Everton encabeçaram a classificação em algum (ou alguns) momento(s).


E isso levando em conta apenas os que ocuparam a primeira posição absoluta, tomando-se pelos critérios de desempate. Houve ainda equipes que chegaram a ombrear com os líderes na pontuação, mas ficaram em desvantagem no goal average, como foi o caso do Burnley, vindo de ótimo sexto lugar na temporada anterior, e do recém-promovido Middlesbrough, comandado pelo ex-zagueiro campeão mundial Jack Charlton e trazendo no centro de seu meio-campo o futuro general do setor no Liverpool, o escocês Graeme Souness.


Após o brilho inicial do Carlisle, o primeiro a tomar para si a liderança foi o Ipswich, ainda em 27 de agosto. Dirigidos desde 1969 por Bobby Robson, os Tractor Boys começavam a se tornar ali um time que brigaria regularmente na parte de cima da tabela até o início da década seguinte. Jogavam um futebol vistoso e reuniam um grupo de atletas de muito bom nível, incluindo nomes que logo chegariam à seleção, como o lateral Mick Mills, o zagueiro Kevin Beattie, o meia Colin Viljoen e os atacantes David Johnson e Trevor Whymark.


Bob Paisley, substituto de Bill Shankly: o Liverpool sob nova direção.
Bob Paisley, substituto de Bill Shankly: o Liverpool sob nova direção.

Três dias depois, entretanto, o Liverpool pegaria o bastão e o carregaria até meados de setembro. Agora dirigidos por Bob Paisley, integrante do chamado “Boot Room” (“sala das chuteiras”, local em Anfield onde a comissão técnica do clube se reunia para discutir táticas), os Reds estavam a caminho de mudar seu estilo de jogo para um modelo de “passe e paciência”. E chegavam ao topo da tabela sem ter, ao menos naquele início, seu principal jogador:  Kevin Keegan, suspenso pela briga no jogo com o Leeds pela Charity Shield.


Porém, diferentemente da equipe sólida e imperturbável que viria a dominar o futebol inglês pela próxima década e meia, aquele Liverpool ainda era sujeito a oscilações: uma derrota por 2 a 0 para o Manchester City em Maine Road e outra em Anfield diante do Burnley por 1 a 0 alijaram-no da liderança, recuperada pelo Ipswich. Mas, para a sorte dos Reds, o time de Bobby Robson logo amargaria sua própria sequência ruim (seis jogos sem vencer pela liga), reconduzindo a equipe de Bob Paisley ao topo até o início de novembro.

 

Por ironia, o Ipswich encerraria sua seca de vitórias batendo justamente o Liverpool em Portman Road por 1 a 0 no dia 2 de novembro. Era um alerta para os Reds, que, no meio da semana seguinte, seriam eliminados da Recopa europeia pelo Ferencváros húngaro, e, no sábado, acabariam surpreendidos pelo Arsenal em Anfield. Na vice-lanterna, mas querendo se aprumar, os Gunners venceram por 3 a 1. Resultado providencial para o Manchester City, que bateu o Stoke em casa (1 a 0) e alcançou o topo pela primeira vez na temporada.


Treinado por seu ex-defensor e capitão Tony Book, o City mesclava nomes de sua geração de ouro do fim dos anos 1960, como Colin Bell e Mike Summerbee, a destaques ofensivos que chegaram depois, como Rodney Marsh e os recém-contratados Asa Hartford e Dennis Tueart. Era uma equipe forte, mas que sairia dos trilhos após ser goleada por 4 a 0 pelo Birmingham em 16 de novembro, entregando a liderança (pelo critério do goal average) novamente nas mãos do Ipswich, que bateu o Coventry em casa pelo mesmo placar.


De todo modo, impressionava o equilíbrio registrado na classificação do campeonato ao fim da rodada daquele sábado, 16 de novembro: quatro times – Ipswich, Liverpool, Everton e Manchester City – somavam 22 pontos. Em quinto vinha, sozinho, o Sheffield United (um time que girava em torno do talentoso meia-atacante Tony Currie, da seleção) com 21. E logo atrás dos Blades outros cinco times se acotovelavam com 20 pontos – só dois a menos que os ponteiros, portanto: Stoke, West Ham, Newcastle, Middlesbrough e Derby County.


UM DEZEMBRO REPLETO DE ZEBRAS


O Manchester City ainda desfrutaria de uma última ocasião na liderança no dia 23 ao golear o Leicester por 4 a 1 em Maine Road. Mas, dali a uma semana, após perder por 2 a 1 para o Newcastle no St. James’ Park, despencaria para o quinto lugar, começando a se afastar de vez da disputa do título. E um novo ator entraria na história para ocupar o topo da tabela: o Stoke City de Tony Waddington, treinador conhecido por apostar em veteranos e em nomes rodados – os quais havia em profusão naquela equipe dos Potters, naturalmente.


A começar pelo novo goleiro titular, contratado naquele mês de novembro: ninguém menos que Peter Shilton, o camisa 1 da seleção, por quem o Stoke desembolsou a quantia recorde do futebol mundial para um jogador da posição – £325 mil – ao tirá-lo do Leicester. Mas havia mais: no meio-campo, o talentoso e rebelde Alan Hudson, ex-Chelsea, que teria rápida passagem pela seleção naquela época. E no ataque, o goleador Geoff Hurst, ex-West Ham – ele mesmo, o autor de três gols pela Inglaterra na final da Copa de 1966.


Nessa primeira investida ao topo da tabela, o Stoke ficaria por duas semanas, até ser desalojado em 14 de dezembro, após perder por 3 a 1 na visita ao Leeds – que tentava se reerguer sob o comando de Jimmy Armfield, após os caóticos 44 dias da passagem de Brian Clough pelo cargo. O novo líder do campeonato era o Everton, dirigido pelo norte-irlandês Billy Bingham, ponta-direita de seu time campeão de 1963 e que na década seguinte levaria a seleção da Irlanda do Norte a duas Copas do Mundo, na Espanha e no México.


Terry Conroy celebra após marcar pelo Stoke contra o Liverpool: os Potters também brigaram pelo título.
Terry Conroy celebra após marcar pelo Stoke contra o Liverpool: os Potters também brigaram pelo título.

Embora contasse com o talento do elegante armador Martin Dobson (o homem da criatividade no Burnley sexto colocado na temporada anterior), aquele Everton de Billy Bingham diferia das vistosas equipes montadas por Harry Catterick no passado por se valer menos da técnica e mais da garra e da aplicação em campo, à imagem e semelhança de seu zagueiro e capitão Mick Lyons. E tinha seu homem-gol: o atacante Bob Latchford, que definiu a vitória de 1 a 0 sobre o Derby fora de casa que alçou os Toffees à liderança.


Contudo, aquela foi uma temporada em que a liderança do campeonato pareceu queimar nas mãos (e nos pés) de quem a possuía e até de quem aspirava a ela. E aquele mês de dezembro trouxe incontáveis evidências disso. Na sexta, 20, em jogo antecipado, o Ipswich bateu o Leicester fora de casa por 1 a 0 e subiu à liderança temporária – que seria ratificada no complemento da rodada no dia seguinte quando nenhum dos seis times que poderiam ultrapassá-lo conseguiu vencer, sendo que três deles tropeçaram dentro de seus domínios.


Os casos de Everton e Stoke eram mais impressionantes por terem perdido em casa pela primeira vez na temporada ali. Os Potters foram batidos pelo Arsenal, 19º colocado, por 2 a 0. E os Toffees sofreram um revés ainda mais inacreditável diante do Carlisle, penúltimo colocado: foram para o intervalo vencendo por 2 a 0 sob festa de sua torcida, mas sofreram a virada no segundo tempo, perdendo por 3 a 2. Ironicamente, o mesmo viria a acontecer com o Ipswich logo na rodada seguinte, a de Boxing Day, na quinta-feira, 26 de dezembro.


Os Tractor Boys ainda não haviam perdido em casa na liga. Seu adversário, o lanterna Luton, ainda não havia vencido fora. Mas um gol de Ron Futcher acabou com ambas as escritas, dando a vitória aos Hatters por 1 a 0. Quem lucrou com mais esta zebra foi o Liverpool, que tratou de atropelar o Manchester City em Anfield por 4 a 1 para assumir a ponta, superando o Middlesbrough pelo goal average. Mas o Ipswich ainda riria por último: dois dias depois, numa rodada em que os Reds folgaram, a equipe de Bobby Robson retornou ao topo.


E assim terminou o ano de 1974, com o Ipswich liderando a liga somando os mesmos 30 pontos do Middlesbrough, mas levando a melhor pelo goal average, Liverpool, Everton e Stoke vinham em seus calcanhares com 29, seguidos por West Ham, Burnley e Manchester City com 28. O Derby, com 27, e o Newcastle, com 26, completavam o Top 10. Na parte de baixo, Carlisle, Leicester e Luton ocupavam a zona de rebaixamento, com o trio londrino Arsenal, Chelsea e Tottenham imediatamente acima, porém com certa folga na pontuação.


VIRANDO A FOLHINHA PARA 1975


Tradicionalmente mais reservado às copas, o mês de janeiro teria apenas duas rodadas da liga, nos dias 11 e 18. Na primeira delas, o Ipswich venceu o confronto direto pela liderança contra o Middlesbrough por 2 a 0 e se isolou no topo da tabela. Porém, na segunda, a equipe de Bobby Robson foi surpreendida na visita ao Carlisle, que venceu por 2 a 1 e reconduziu o Everton à ponta, compensando o estrago feito aos Toffees no Goodison Park no mês anterior. E os demais resultados embolaram tudo de novo nas primeiras posições.


O Everton, que derrotara o Birmingham fora de casa por 3 a 0, liderava com 33 pontos, seguido por Ipswich e Burnley, com 32. Depois vinham nada menos do que cinco equipes, todas com 31 pontos: Liverpool, Derby, Middlesbrough, Stoke e Manchester City. Era um certame em que qualquer tropeço, zebra ou até folga na rodada reembaralhava totalmente a classificação. Assim, quando o Liverpool visitou o Newcastle em jogo isolado em 12 de fevereiro, podia destronar o rival de Merseyside do topo se vencesse. Mas perdeu por 4 a 1.


Quem acabou superando o Everton na liderança foi o Stoke no sábado, 15 de fevereiro, em rodada com apenas quatro jogos devido à participação dos clubes da primeira divisão na FA Cup. Porém, dez dias depois, no complemento da mesma rodada, o Everton voltou ao topo com um 3 a 1 no Luton em casa. O time de Billy Bingham venceria a seguir o Arsenal fora e o Queens Park Rangers em casa e, ao empatar em 0 a 0 com Leeds em Elland Road, em 15 de março, abriria três pontos de vantagem para o vice-líder Burnley com um jogo a menos.


O Everton (camisa escura) vence o Luton e assume a liderança no fim de fevereiro de 1975.
O Everton (camisa escura) vence o Luton e assume a liderança no fim de fevereiro de 1975.

Num campeonato tão embolado, o fato de um time abrir tal vantagem parecia indicar o campeão enfim despontando. Só que não foi assim: o Everton somou só um ponto nas três partidas seguintes – a última delas, nova desastrosa derrota para o Carlisle por 3 a 0, agora fora de casa, em 29 de março – e entregou a liderança nas mãos do rival Liverpool. Pelos dias seguintes, reinaria o caos: a liderança retornou às mãos do Everton no dia 31, passou ao Ipswich no dia 1º de abril, voltou ao Everton no dia 4 e então ao Liverpool no dia 5.


O campeonato já adentrava a reta final e seguia num impressionante equilíbrio. Naquele dia 5, um sábado, o líder Liverpool tinha os mesmos 47 pontos de Everton, Stoke e Derby, com o Ipswich logo atrás por um ponto. Porém, a desvantagem para os Reds e os Potters na disputa estava no número de jogos: teriam apenas três por fazer, contra quatro dos demais. Assim, na quarta-feira, 9 de abril, uma rodada de ajuste com apenas três partidas acabou tendo influência crucial no desfecho da competição. Foi quando o Derby chegou à ponta.


A HORA DO CAMPEÃO


A personalidade e o carisma de Brian Clough haviam feito do técnico um ídolo em Derby, ao menos entre torcida e elenco, o que se escancarou quando ele e seu assistente Peter Taylor resolveram levar às últimas consequências a disputa com Sam Longson, presidente do clube, e pedir demissão de seus cargos em outubro de 1973. Nos dias que se seguiram, houve protestos dos torcedores, com faixas levadas às arquibancadas do Baseball Ground, e até um motim dos jogadores exigindo do mandatário a readmissão de Clough e Taylor.


Longson, porém, não deu ouvidos. Sua resposta aos protestos foi rapidamente nomear um novo treinador, e o escolhido foi um ex-jogador do clube na virada da década, trazido para o Derby pelo próprio Brian Clough para agregar sua experiência de líder e campeão a um elenco um tanto verde. Era o escocês Dave Mackay, que se celebrizara ao defender o Tottenham de Bill Nicholson e participar com destaque das inúmeras conquistas dos Spurs entre 1961 e 1967. Um jogador de muito boa técnica, mas sobretudo de fibra e caráter.


No Derby, Mackay atuara entre 1968 e 1971, quando saiu para aceitar uma proposta do Swindon, da terceira divisão, para acumular os cargos de jogador e técnico. Depois de uma temporada nas duas funções, ele acabou pendurando as chuteiras e transferindo-se ao Nottingham Forest apenas como treinador, de onde retornou ao Derby, rival na região de East Midlands. E, bem ao seu estilo, já chegou ao Baseball Ground impondo sua hierarquia e declarando guerra aos jogadores rebeldes, os quais chamou de “um time de colegiais”.


“Sou um homem e gosto de lidar com homens, não com crianças desorientadas”, vociferou o novo técnico, rechaçando a ameaça de uma greve dos jogadores. Mackay recebeu o time em terceiro lugar após 13 jogos naquele campeonato de 1973-74, mas teve início ruim, sem vitória nos seis primeiros jogos e despencando para a nona posição. Porém, logo tudo entrou nos eixos: até o fim de março de 1974 o time só perderia mais duas partidas. No fim da campanha, ficaria em terceiro, como estava quando da chegada do escocês.


Na segunda metade daquela temporada, ele já começaria a desenhar o novo Derby para 1974-75, um time com sensíveis diferenças – de nome e de estilo – daquele que conquistara o título da liga em 1972. Dois titulares naquela campanha – o lateral-esquerdo John Robson e o meia Alan Durban – já haviam deixado o clube logo após o caneco inédito. Em meados de 1974, o volante John McGovern e o atacante John O’Hare (que haviam perdido lugar no time com Mackay) também sairiam para se juntarem novamente a Brian Clough no Leeds.


Além deste quarteto, outros dois titulares da conquista de 1972 perderam lugar no time-base do Derby para 1974-75, mas permaneceram no clube. Um era o zagueiro e capitão Roy McFarland, que rompera o ligamento do tendão de Aquiles em maio de 1974 defendendo a seleção inglesa contra a Irlanda do Norte pelo Campeonato Britânico em Wembley, lesão que o tirou de quase toda a temporada seguinte (voltaria só na reta final). O outro era o veterano ponta-esquerda Alan Hinton, que vivia seus últimos tempos no Baseball Ground.


Dave Mackay (à esquerda), técnico do Derby, e seu assistente Des Anderson beijam a taça da liga.
Dave Mackay (à esquerda), técnico do Derby, e seu assistente Des Anderson beijam a taça da liga.

Os cinco titulares de 1972 que permaneciam no novo Derby de Dave Mackay eram o goleiro Colin Boulton, o lateral-direito Ron Webster, o zagueiro Colin Todd, o meia-armador Archie Gemmill e o centroavante Kevin Hector. Os dois primeiros eram pratas da casa, no clube há mais de uma década. Todd viera do Sunderland em 1971 para formar dupla de nível de seleção com o agora ausente Roy McFarland. O dinâmico Gemmil, vindo do Preston em 1970, era o motor do time. E Hector, ex-Bradford Park Avenue, o goleador oportunista.


Já as novidades começavam por Peter Daniel, eterno reserva que ganhava um lugar ao sol na vaga do lesionado Roy McFarland na zaga (e faria brilhante temporada). Na lateral-esquerda, o elegante David Nish, trazido do Leicester logo após o título de 1972, era um ganho de qualidade em relação ao discreto John Robson. No meio, Bruce Rioch, trazido do Aston Villa em fevereiro de 1974, e Henry Newton, ex-Everton (última contratação de Clough para o clube), ocupavam os lugares que haviam sido de John McGovern e Alan Durban.


Já no ataque, outro antigo reserva ganhou uma das vagas: Roger Davies, centroavante muito alto, ótimo no jogo aéreo, mas também de boa técnica, e que mais tarde migraria para o futebol belga, defendendo o Club Brugge (e sendo eleito o Jogador do Ano no país). Fechando o time, o reforço mais recente era o mais comentado: Francis Lee, atacante rápido, esperto, insinuante e notório cavador de pênaltis, nome certo na seleção inglesa de 1968 a 1972, vinha do Manchester City (onde era ídolo) às vésperas do início da temporada.


Mas não era só em mais da metade dos nomes que o Derby de Mackay diferia do de Clough. Se o antigo treinador baseou seu sucesso numa defesa firme e bem protegida, o novo lançava o time à frente sem concessões (o que levava a jogos mais abertos, para o bem ou para o mal). Se John McGovern em 1972 era um cabeça de área clássico, fixo à frente da zaga, em seu lugar agora havia Bruce Rioch, que pisava com muito mais frequência na área adversária – a ponto de terminar a campanha como o artilheiro do time (15 gols).


A CAMPANHA RUMO AO TÍTULO


Assim, dentro dessa proposta de jogo, não seria surpresa que o time oscilasse, como oscilou desde o início da campanha. Na largada, o time venceu apenas um dos primeiros sete jogos (2 a 0 sobre o Sheffield United em casa) com quatro empates e duas derrotas, ocupando a discreta 14ª posição na metade de setembro. Contudo, logo em seguida o time encaixou uma série de seis jogos sem derrota, com quatro vitórias, incluindo uma goleada de 4 a 1 no Chelsea também em casa, o que valeu saltar para o terceiro posto dentro de um mês.


A primeira boa sequência chegaria ao fim na visita ao Carlisle, que após ter alcançado a liderança só havia vencido uma partida nas dez seguintes. Em 19 de outubro, o pregador de peças oficial da temporada impôs um contundente 3 a 0 ao Derby, que dali a uma semana voltaria a perder, agora em casa, para o Middlesbrough por 3 a 2. Em novembro, o time se reergueria parcialmente, vencendo três dos quatro jogos, superando o Leeds fora de casa (1 a 0) e o Queens Park Rangers (5 a 2) e o então líder Ipswich (2 a 0) no Baseball Ground.


Ao entrar em dezembro, o Derby ainda arrancaria um ótimo 2 a 2 contra o Liverpool em Anfield, mas perderia a chance de dar saltos maiores ao perder de 1 a 0 em casa para o Everton – que pulou para a liderança com resultado – e fora de casa para o Luton – lanterna, sem vencer há 11 jogos e somando um único triunfo (sobre o Carlisle) em 21 partidas até ali – pela mesma contagem. Os dois revezes derrubaram o time de Dave Mackay para a décima posição. Mas a rodada de Boxing Day marcaria o início de outra sequência favorável.


A vitória de 2 a 1 sobre o Birmingham naquele dia 26 de dezembro foi seguida dali a dois dias por um confronto crucial diante do Manchester City em Maine Road na última rodada do ano. Os mancunianos vinham de derrota por 4 a 1 para o Liverpool e não venciam há três jogos, mas ainda estavam invictos em casa na liga e apenas um ponto atrás dos líderes. Até toparem com o Derby, que abriu o placar aos 21 minutos do primeiro tempo num chute de pé direito de Henry Newton da altura da meia-lua que acertou o ângulo de Joe Corrigan.


O City, que já tinha o domínio do jogo antes de sofrer o gol, partiu com ainda mais força em busca do empate e só o encontrou já no segundo tempo, aos 17 minutos, quando Asa Hartford fez o passe à frente para Rodney Marsh e este abriu na direita para Colin Bell encher o pé. Dois minutos depois, contudo, os donos da casa seriam batidos por seu ex-jogador: Franny Lee recebeu na ponta esquerda, girou sobre dois marcadores e, do bico da área, contra o vento, acertou um chutaço inapelável para Corrigan, decretando o 2 a 1. 



Os mesmos Newton e Lee marcariam os gols de outra importante vitória, 2 a 0 no Liverpool em casa, na primeira partida do Derby no ano de 1975 pela liga. E Newton faria seu terceiro e último gol naquela campanha no jogo seguinte, a vitória de 1 a 0 fora de casa sobre o Wolverhampton O quarto triunfo seguido elevou o Derby ao quinto lugar, apenas dois pontos atrás do líder Everton. Nos jogos de fevereiro, no entanto, todo o esforço para recolocar os Rams na briga parecia ter ido por água abaixo pelos tropeços acumulados.


Goleado pelo Queens Park Rangers por 4 a 1 em Loftus Road no dia 1º, o time parou no 0 a 0 em casa com o Leeds uma semana depois, antes de registrar, no dia 22, sua única vitória pela liga naquele mês: 2 a 1 no Arsenal, também em casa, com dois gols do reserva Steve Powell. Três dias depois, porém, o Derby sofreria outra derrota pesada: 3 a 0 para o Ipswich em Portman Road. Ao fim de fevereiro, os Rams ocupavam o oitavo lugar, quatro pontos atrás do líder Everton. Pela frente, os dois últimos meses da campanha. Era hora de reagir.


E em março essa reação ganharia corpo: com calendário cheio na liga – seis jogos, três em casa e três fora – o Derby venceu cinco. Destaque para os triunfos como visitante: 2 a 1 no Chelsea, 2 a 0 no Newcastle e um amasso de 5 a 2 sobre o bom time do Burnley. O único revés veio em casa contra o Stoke (1 a 2), mas nos dois outros jogos no Baseball Ground o Derby se impôs: fez 3 a 1 no Tottenham e 5 a 0 no Luton com cinco gols de Roger Davies – que ainda teve outros dois anulados, um chute salvo sobre a linha e outro acertando a trave.


Aquela virada de março para abril foi mais um retrato do insano calendário do futebol inglês na época – ainda mais desgastante do que hoje. Basta dizer que o Derby (assim como vários outros times) teve de entrar em campo três vezes num intervalo de quatro dias, enfrentando o Burnley fora de casa no dia 29, o Luton em casa no dia 31 e recebendo o Manchester City no dia 1º de abril, folgando somente no domingo de Páscoa, dia 30. E ainda assim acabou vencendo os três: dois gols de Bruce Rioch garantiram a vitória por 2 a 1 sobre o City.


ALCANÇANDO O TOPO


No sábado seguinte, dia 5, um gol de Kevin Hector no último minuto arrancou um valioso empate em 1 a 1 com o Middlesbrough no nordeste inglês. Quatro dias depois, era a vez de receber o Wolverhampton, em partida originalmente marcada para novembro de 1974 e adiada pelas chuvas em Derby. Neste jogo, os Rams teriam um reforço: era Roy McFarland, recuperado da lesão no tendão de Aquiles e que entraria em campo pela primeira vez após quase um ano. Um gol de Franny Lee deu ao Derby a vitória por 1 a 0 e, enfim, a liderança.


O Derby abria dois pontos de frente na liderança a três rodadas do fim do campeonato – embora alguns times tivessem jogos a menos. E seguraria essa diferença na rodada completa do sábado seguinte, ao vencer o West Ham em casa por 1 a 0, gol de Bruce Rioch. Os Rams chegavam a 51 pontos em 40 jogos. Liverpool e Everton vinham a seguir com 49. Em quarto, o Ipswich somava 48, mas em 39 partidas. Já o Stoke – em quinto – e o Sheffield United – em oitavo, mas com apenas 38 jogos – tinham remotíssimas chances matemáticas.


Uma semana depois, em Filbert Street, o Derby parou num 0 a 0 diante do Leicester. O que poderia ser considerado um tropeço, entretanto, revelou-se um ótimo resultado: naquele mesmo dia o Liverpool perdeu em Middlesbrough (1 a 0), o Everton caiu em casa diante do Sheffield United (3 a 2) e o Ipswich tombou na visita ao Leeds (2 a 1). Com a combinação de resultados, Liverpool, Everton, Stoke e Sheffield United saíam da briga, todos ao mesmo tempo. Só sobrou o Ipswich, quatro pontos atrás, mas com dois jogos ainda por fazer.


Mas nem o Ipswich resistiria por muito tempo: tendo de vencer seus dois últimos jogos, tropeçou logo no primeiro ao empatar com Manchester City por 1 a 1 em Maine Road na quarta-feira, 23 de abril, entregando o título de bandeja ao Derby, que no sábado seguinte já pisou o gramado do Baseball Ground como campeão, recebendo oficialmente a taça diante de 36.882 torcedores (seu recorde de público na temporada), antes de enfrentar o rebaixado Carlisle – e empatar em 0 a 0, mas o resultado ali era o que menos importava.



E o Derby era campeão inglês pela segunda vez em quatro temporadas. Somava, ao fim, 21 vitórias, 11 empates e 10 derrotas, 67 gols marcados (segundo ataque mais positivo, um gol atrás do Burnley) e 49 sofridos. Seus 53 pontos ganhos, menor pontuação de um campeão desde o Chelsea em 1955, eram um reflexo do equilíbrio e até da inconstância dos adversários: Liverpool e Ipswich terminaram com 51, seguidos por Everton (50), Stoke, Sheffield United (ambos com 49) e Middlesbrough (48, só cinco a menos que o Derby).


Na temporada seguinte, os Rams obteriam um bom quarto lugar e quase eliminariam o poderoso Real Madrid na Copa dos Campeões. Mas o declínio viria rápido: em 1980, o Derby desceria à segunda divisão e, quatro anos depois, à terceira. Ainda em meados dos anos 1980, o controverso magnata das comunicações Robert Maxwell se tornaria dono do clube. Com ele, o retorno à elite viria rápido, graças a dois acessos seguidos, culminando com o bom quinto lugar em 1988-89, num time que contava com Peter Shilton no gol.


Aquele seria a última campanha de destaque dos Rams, que voltariam à segunda divisão como lanterna dois anos depois. Mas nada superaria a vergonhosa campanha da temporada 2007-08, já na era Premier League, na qual terminaram com apenas uma vitória em 38 jogos. Hoje, de volta de mais uma breve passagem pela terceira divisão, o clube tenta se reerguer, mas sonhar em repetir as glórias dos anos 1970 parece algo distante. Assim como para boa parte dos clubes que quase levaram a taça naquela longínqua temporada 1974-75.

 
 
 

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